A morte
- Egon Ralf Souza Vidal
- 18 de ago. de 2017
- 3 min de leitura
Tabu - Jornal sem preconceitos
Canavieiras, 22 de feveireiro de 2016
A despeito de sua pertinência à vida, a morte ainda é um tema pouco discutido. Há quem a enxergue com horror – como um verdadeiro monstro ceifador de sonhos e esperanças. Também existem as representações de medo, angústia e tristeza que a morte recebe na sociedade, junto das lamentações de quem continua a “existir” – como se a perda real fosse para quem partiu, e não para quem ficou neste plano terrestre.
Decorre da morte múltiplas interpretações sociais que estarão especialmente envolvidas com os laços culturais que se lhe relacionam. Em culturas orientais, por exemplo, a morte ganha papel coadjuvante na manifestação da vida e é vista como mais uma manifestação da mesma. O luto dá espaço à alegria, e o sofrimento a novas esperanças.
A morte é relatada segundo a perspectiva de quem vive, e não sob a perspectiva de quem morre. Apesar de espiritualistas terem demonstrado o valor irreal da morte como um fim, tais considerações ainda são relegadas à descrença, seja por motivos religiosos de quem se opõe a tais descobertas, seja pela ausência de evidências empíricas a “olho nu”. Sobretudo, o sofrimento relativo à morte pode estar também relacionado ao desconhecimento do que se sucede ao entre querido que partiu. Desse modo, por ser cultural, o conhecido e o desconhecido da morte está intrinsecamente relacionado a concepções religiosas ou, a convenções científicas.
A cientificidade da morte revela apenas a interrupção da vida orgânica, os processos de luto e algumas outras características. A religiosidade da morte – como um diálogo com o aspecto científico – visa revelar o invisível, aquilo que ainda carece de evidências cientificamente testadas, mas que, sobretudo, coordena os pensamentos e emoções de cada indivíduo a justificativas que apaziguam o coração em momento de tristeza. A vontade de Deus passa a ser predominante, e o sofrimento dá espaço à máxima: “foi feita a vontade de Deus”.
O fato de a morte provocar sofrimento, supõe-se, também pode estar relacionado com os níveis de apego de cada indivíduo. Nesse caso, toda perda é uma morte e uma afirmativa de que se acreditava que o que se foi lhe pertencia, e não deveria ter partido sem o seu próprio consenso.

Quando dialogam em conformidade, a cientificidade da morte com a sua religiosidade, harmonizam-se as formas de enfrentamento cognitivo-emocional e comportamental. Isto produz efeitos tranquilizantes de aceitação à morte, tanto a nível racional, quanto a nível emocional e comportamental.
A frustração de quem não empregou seus esforços em conviver bem com o ente querido que partiu, bem como a certeza de que poderia ter feito mais, também são entraves para a aceitação da perda. Racionalmente, quase sempre a morte traz perdas e prejuízos. Contudo, sob o olhar espiritualista, a morte existe senão como um momento de reformulação da própria vida.
De fato, o sofrimento físico ou psicossocial deveria ser mais relevante para condolências do que a morte. Viver sofrendo é muito mais doloroso, acredita-se, do que a morte. Não deveríamos desse modo, lamentar por aqueles que se foram; deveríamos, isto sim, lamentar por nossas condições de desigualdade e, em um luto estimulante, objetivar transformar a nós mesmos e aos outros – como extensão – em reflexões genuínas de boas qualidades. Poderíamos, então, deixar o desprazer das amarguras, da raiva e da depressão, e indo em direção à aceitação desse evento que é morrer, abraçar a vida e a morte como a mesma instância, lembrando sempre que a nossa hora irá chegar.
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